Não é necessário que saias de casa. Fica
à mesa e escuta. Não escutes, espera apenas.
Não esperes, fica em silêncio e só. O mundo
virá oferecer-se a ti para que o desmascares,
não pode fazer outra coisa, extasiado, ´
contorcer-se-á diante de ti.

Franz Kafka, "Aforismos"


segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Ruas do Chiado; Miradouro do Adamastor

À entrada um homem perguntou se eu queria alguma coisa, sorriu e moveu a mão dentro do bolso. Virei-me devagar, disse um "não" normal e segui em frente. Apesar de termos ficado amigos pensei que talvez devesse ter-lhe dado mais um segundo de atenção. Continuei a descer as escadas em direcção à minha droga, aquela que me tinha chamado a atenção quando passava pela rua principal e por um cantinho encontrei umas arvorés altas no que parecia ser uma espécie de jardim no final duma colina, acertei. Em prespectiva o Tejo, enorme, dele vindo um som - não sei bem do quê, apostei em barcos - que ali se potenciava no ouvido, som suave, búzio industrial talvez ajudado pela altura a que estava. Havia uma esplanada mesmo atrás, com um quiosque próprio de jardim, não me interessou. Perto duma pequena grade a fazer de muro, baixei os olhos e casas apareceram aos meus pés, antigas, pós a cair e com eles gerações, daqui a uns anos pensei que aquilo tudo limpo para mais prédios sem arquitectura nem história. Havia grupos de universetários sentados no chão, alguns fazendo roda e no meio deles ganzas acendiam-se, pares em bancos de jardim, guitarristas amadores a apoiar um cantor em potencial, fotográfas captam imagens que ninguém irá ver. Jovens estrangeiras - cabelo loiro e línguas, talvez, nórdicas - a passear o cão, desempregados, intelectuais, raparigas de coração despedaçado, idosos a cumprir tempo. Num banco uma rapariga defendia ferverosamente o direito dos casais homossexuais à adopção, um rapaz ouvia-a com a mão de volta de mortalhas. Um estudante de jornalismo chegou e veio ter comigo, trazia um microfone e disse que estava a fazer um trabalho sobre este local - que apesar de há tão pouco o conhecer ter logo reparado em algo especial -, perguntou o porquê dali estar, quais eram alguns dos meus planos para o futuro, e que relacionasse a estátua do Adamastor - que estava mesmo atrás de mim - com os problemas que os jovens enfrentam hoje em dia; tipo fixe, pelo jeito que tinha para falar e a prespicácia até se pode safar; andava de ilha em ilha. Escrevi isto, e deixe-me estar, sentado, a ver o rio e com o seu som nos ouvidos.
Os olhos rolavam por todo o lado sem pensar em nada, e tudo desapareceu. Sozinho comigo, comecei a lembrar-me de alguém.

3 comentários:

'stracci disse...

Amo esse lugar!! Sento.me ao pé dessas grades, a contemplar, e tudo desaparece.

Catarina* disse...

Nao sei ao certo porque tenho um ponto final na minha vida. tenho e pronto, agora isso basta-me. sabes que a minha vida, é bastante instavel, principalmente meus ideais - tu sabes. acho que já vezes chegas até a saber mais de mim mesma do que eu propria. é assim. isso agora nao me baralha nem me confunde. é meramente um lugar por habitar, e tu és o desconhecido já amigo - talvez meu melhor amigo. é a ti que confio as palavras que só trocava anteriormente com simples espelhos. por coversas que possamos ter, nao sei, nao sei mas és importante para mim. se um dia e acredito que seja em breve eu tranformar este ponto final, em ponto e virgula, agradecerei-te por tudo, foram apenas palavras, mas tu nao imaginas o que reflectiram em mim. hoje por volta da 1:34h da manhã senti frio, senti outra pessoa com frio. outra pessoa que nao podia estar ali. "descia as escadas e via um homem que nao podia estar ali, quando subia voltava a vê-lo. e acabava sempre por ver o homem que nao estava ali." nao sei porque te estou a contar que senti uma pessoa que nao podia estar ali - perto a mim. na verdade é que senti. senti e pronto. agora conformo-me rapidamente sem margens para suposições. e ponto final.

'stracci disse...

Com sol é perfeito! Estás a ver aquela preguiça que os raios quentes provocam? Mmmm... é tão bom tê.la com vista para o rio!