Não é necessário que saias de casa. Fica
à mesa e escuta. Não escutes, espera apenas.
Não esperes, fica em silêncio e só. O mundo
virá oferecer-se a ti para que o desmascares,
não pode fazer outra coisa, extasiado, ´
contorcer-se-á diante de ti.

Franz Kafka, "Aforismos"


sexta-feira, 30 de outubro de 2009

O que gosto mais em Lisboa... é do eléctrico.

Gosto da confusão que se faz nos Prazeres para entrar, com os turistas todos a cumprirem roteiros (e já agora, para ser sincero, falo em especial das estrangeiras, loiras, olhos azuis, olhos verdes, brancas como a neve, outras línguas, nenhuma queixa das portuguesas, longe disso, também gosto muito de as ver por lá, mas sabe bem variar as vistas de vez em quando), das velhas a queixarem-se dos estrangeiros - "passam o dia nisto, a estorvar de cá para lá, mas porque não param eles? há tantas coisas para ver" - e sempre de olho desconfiado a ver quem lhe quer gamar o saco, do pequeno barulho, quase imperceptível, que fazem os carris, da manivela e dos pedais do - ou da - guarda-freio, do jeito quase desengoçado de andar, a fazer-me lembrar as pistas de carros eléctricos que juntava peça a peça em miúdo, do facto de ser de madeira, do parecer que "é agora que isto vai abaixo", das cores, dos bancos, das janelas, e da sua ausência para podermos cheirar as ruas, gosto ainda mais quando vai à "pinha", em pé, procurando possibilidades em todo o lado, outros ângulos, olhares cruzados, dos putos que se empoleiram na parte de fora e fazem revés com os espelhos dos carros estacionados, em competição pelo título de mais "maluco", e das velhas a ralharem com eles enquanto eu me rio, pelas casas antigas que vou passando, em especial antes do Chiado, numa pequena subida, quando há pequenas ruas a surgirem do lado direito como se fossem ramos, e descem por aí abaixo até ao mar, com fios a encher o céu. Depois é sair no Chiado - descansem que não acaba aqui -, e que só por si já vale a pena, fazer o que há a fazer, e voltar a esperar pelo próximo eléctrico.

5 comentários:

Anónimo disse...

E o eléctrico combina contigo.

Pecado Original

MafaldaMacedo disse...

vês como a minha terra é um poço de coisas maravilhosas?
adoro ver os electricos, já que andar, faz alguns anos que os deixei. *

'stracci disse...

O que eu mais queria, quando cheguei a Lisboa, era andar num eléctrico «dos velhinhos», mas sempre que ia apanhar um eléctrico vinha um «dos novos» e eu ficava danada. Bem, um ano depois já concretizei o sonho algumas vezes e de todas elas me senti numa dimensão qualquer em que se anda em carrinhos de brincar, as pessoas são bonecos animados e as ruas são estreitinhas e cruzadas. Adoro!

Tani disse...

Olha, sabes, fiquei com uma nostalgia muito grande agora porque escreveste o cheiro de Portugal. E como eu tenho saudades do cheiro de Portugal...

Marisa Fernandes disse...

É bonito, não é?

Viajar na História e no Sonho!*