Não é necessário que saias de casa. Fica
à mesa e escuta. Não escutes, espera apenas.
Não esperes, fica em silêncio e só. O mundo
virá oferecer-se a ti para que o desmascares,
não pode fazer outra coisa, extasiado, ´
contorcer-se-á diante de ti.

Franz Kafka, "Aforismos"


quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Call poetry to a girl

I
Adoraria este verso poder passar
e com ele a ordem que se exige mas aqui não entrou.
Não sentisse eu a necessidade de, em tentativa, (me) explicar.

II
Bato a uma porta (quase sem tocar.) Um adamastor de sopro fino.
De dentro, pareço ouvir uma mão a raspar. Dedos. (Que língua
[é a dos dedos?)
A porta destrancada, ninguém abre.

Cortinas duma janela perto afastam-se, uma mão de cada canto.
Um olhar surge, parecendo reclamar palavras em falta.
Em quatro cinco segundos os meus olhos alheiam-se das regras da
[física.

Uma ampulheta deixa de escorrer apesar de cheia
o meu relógio atravessou o pulso (aonde foi ele?). Desço os olhos,
o corpo inclina-se para trás. O ar volta. Hostil, mundano.

Acordo deportado.
Neste país, as ruas e avenidas deixam cimento e calçada para
[outros
entregando a cada viajante tempo para seus segundos rever.

III
O silêncio ganhou asas
e de tentar subir prendeu-se na última copa,
aí ficando.

Momentos há em que a Natureza de quem
a uma fonte chega e bebe abanando em seguinda as mãos
chego a invejar.

Não houvesse em mim
(seja o que for que em mim há)
e que para além da vontade de beber me suscita a seguir com o
[jorro.

E que agora cria vontade de à chuva correr
e através de cada gota
equilibrar o que em mim esquentando possa estar.

IV
Uma caneta tenta (sem tinta)
deixar marca numa folha (agora longe),
entregue ao vento.

O vento enfia-se no meu ouvido
e por muito que lhe pergunte
nada diz.

V
Com essa caneta (para além de me esconder como escondo)
poderia, fraco, tentar desculpar-me
e com elas (pouco) ou nada mudar.

Tentar abrir um novo dicionário
(com o teu nome em cabeça, os teus olhos em imagem)
e a cada nova palavra me descurar do que realmente pretendo.
[(Realmente já tarde...?)

Mas o meu poema és tu.
E por ser ele quem é
penso ser ímpossível (e absurdo) algo mais se acrescentar.

Tu não me conheces. Eu não te conheço. Nem uma palavra.
Descobri teu nome, desconfio que sabes o meu.
Se não souberes, pergunta aos teus olhos. Estou certo que eles
[sabem. (Aí me voltarei também a descobrir... e perder.)

VI
Num tabuleiro de Xadrez
peões mexeram-se para não perder (Medos?)
ainda que com a esperança que outros chegassem desejosos de
[vitória.

4 comentários:

pecado original disse...

Isto saiu daquelas folhas rasgadas?

'stracci disse...

Genial!

Joana M. disse...

Apaixonei-me por estas palavras
e não disse a ninguém.

Violet disse...

Que palavras tão bonitas, que vontade que dá de ler! :)