Não é necessário que saias de casa. Fica
à mesa e escuta. Não escutes, espera apenas.
Não esperes, fica em silêncio e só. O mundo
virá oferecer-se a ti para que o desmascares,
não pode fazer outra coisa, extasiado, ´
contorcer-se-á diante de ti.

Franz Kafka, "Aforismos"


sexta-feira, 26 de outubro de 2012

há em mim
o ser que surge quando contigo
a atenção que às tuas expressões dedico
como se, fechados os olhos
mentalmente seguisse as notas de um violino
sendo a melodia o teu sorrir
acompanhado pelo conjunto que se forma
e que se estende até aos teus olhos, os teus cabelos
a tua face, tu por inteiro

as preocupações afastam-se
e algo em mim tende a escapar-se
viro os olhos um segundo
e uma porta com o vento aberta
sem que nada capaz de fazer dado que sem chave
- ou sem a saber usar -

as frases mais soltas num instante
as frases pela boca sem delas dar conta
procurando, ao que me apercebo, seguir a melodia
ao mesmo tempo que do vulcão
- juro que, por aí, um vulcão
medindo movimentos -
um sorriso que me desperta da distraída contemplação
um pulsar mais quente e vigoroso comprovando a existência

e há em mim
o ser que aparece quando de ti afastado
aquele que dessa distância
- e por essa distância -
se torna consciente do quão presente te tornas
dado que após, entre ruas, esquinas, multidões
um sorriso que me invade a face
um suspiro que antecede um respirar convicto
como se com a inspiração tu, após a inspiração
a tua voz de novo, a necessidade da tua voz de novo...

e esses dois seres
- tão estranhos para mim, ainda que em mim -
quebram as dúvidas que poderia ter
em relação ao que sinto
lembre-me eu da sua materialidade
e os consiga fazer nascer

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