Não é necessário que saias de casa. Fica
à mesa e escuta. Não escutes, espera apenas.
Não esperes, fica em silêncio e só. O mundo
virá oferecer-se a ti para que o desmascares,
não pode fazer outra coisa, extasiado, ´
contorcer-se-á diante de ti.

Franz Kafka, "Aforismos"


segunda-feira, 12 de outubro de 2009

"What we have here... is a failure to communication"



"But I guess the larger question is: Why is the city of angeles so held-banged on destroying his female population?"

Um café perto do local de trabalho, empregados de farda, chávenas com o símbolo do café, sorrisos rápidos a meia cara, nas mesas um tampo de vidro sobre uma madeira gasta, tons verdes com o amarelo das lascas. 5 lugares em círculo, cafés e águas, um copo de whisky a meia haste para o director. A mesa é curta e alguém fica entre duas cadeiras, acompanhando com os olhos as conversas do costume; um dos colegas que se sentava ao seu lado ia-lhe mirando o peito, deixando a boca aberta sem fazer muito para disfarçar. Bebeu o café em dois golos seguidos, um pequena pausa com um avaliar sobre o resto da mesa, onde ainda se viam pacotes de açúcar serem rasgados. Tem agora os braços cruzados sobre os joelhos, na mala, deixada ao lado da cadeira, ouve o telemóvel e os seus olhos fixam-se no vazio, sustêm a respiração. Na mesa continua a conversa e os sorrisos. Desce mecanicamente o braço onde olha directamente para o botão vermelho que lhe faz a chamada; era uma amiga interessada em saber como lhe estava a correr o primeiro dia. Os sorrisos dão lugar ao fôlego, e o director, depois de passar a mão pela cara, pergunta-lhe a opinião sobre o assunto que estavam a discutir. Ela torna-se estátua, o telemóvel começa a escorrer da mão direita e isso fá-la acordar, segurando-o a tempo. Uma mulher já há muito tempo na empresa solta um sorriso mostrando um pouco dos dentes, leva a cara ao centro da mesa e virada na direcção da estagiária diz: "Coitadinha da rapariga, perdeu a voz."

2 comentários:

pecado original disse...

Perdeu a voz por querer gritar.

Joana M. disse...

E, calada, disse tanto.