Descem a rua, apresentando esta um tom mais carregado, próprio da altura do dia, em especial ao nível do paralelo, ainda que suavizado por uma lua que as nuvens existentes não são capazes de apagar. Os passos deslizam, não só pela inclinação mas, sobretudo, pela leveza oferecida pelo álcool. Existem outras vozes, e outros passos, alguns perto, mas tornados imperceptíveis pela conversa, mesmo que decorrendo a um timbre normal e pausado. Os corpos, ainda que maioritariamente alinhados no seu trajecto, por vezes fazem-se surgir, dobrando-se para ouvir ou falar melhor, isto quando não param para a cara procurar mais um golo envolto em pensamentos denunciados pelo olhar. O que é dito apresenta naturalidade, em especial a uma hora da noite que se vai alongando, mas também é fruto de um raciocínio que agora se deixa soltar com mais fluidez, soltando palavras que se entrelaçam numa lógica própria. Os edifícios em volta, moldados pelo traçado, vão se sucedendo. Cada um deles apresenta a sua beleza e peculiaridade, fazendo desejar o próximo e esquecer o anterior. De repente, estes ganham vida, não só se transfiguram com se movem, alternando lugares, fazendo a própria rua alterar-se. Quem passa continua, ainda que num outro ritmo, numa outra linguagem. O sentido do trajecto difere, perdendo-se as anteriores referências, mas continua-se a andar. Houve algo que ficou por dizer e o que se deve falar futuramente deixa de ter contexto, isto caso nada mude.
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