Hoje, tal como muitos dias, segui o caminho normal da minha consciência, a biblioteca municipal. Igual a tantas outras, sendo o único relevo...os livros. (Incrível como o espaço físico é muitas vezes sobrevalorizado em detrimento da verdadeira função). Têm, como todas as outras, uma biblioteca, onde estão arrumados cuidadosamente muita da sabedoria esquecida. Há um espaço, onde sentados se lêem inúmeros jornais e revistas, diários, semanais, mensais, anuais…Esta tem o requinte de possuir outra biblioteca, dedicada aos mais jovens. Um excelente auditório e dois espaços para Internet. Enfim, um verdadeiro luxo desperdiçado na ignorância de quem do conhecimento foge.
Sentei-me, pensativo no livro que tinha em mãos, aconselhado por duas amigas,"A Ponte para a Eternidade" de Richard Bach, estou longe de o acabar mas para quem adora metáforas têm aqui uma pérola.
Ao mesmo tempo que me absorvia na leitura, também em mim concentravam-se ideias para outras coisas, fruto da imaginação da história. Ideias de que também eu poderia ser capaz de escrever um dia algo que fizesse alguém como eu sentar-se. Há poucas coisas mais poderosas. Ideias de que não seria capaz, fruto duma descrença em quem exige muito de si próprio.
Infelizmente tive de ir, e, como o livro não me pertence mas não podia deixar um marcador, faço algo que não se deve fazer em algo que não é nosso, um vinco numa página. Espanto meu surge quando reparo que este já tinha sido marcado na mesma folha, mas na página contrária. Ao tentar desdobrá-lo ouve algo que me impediu, o passar dos anos dessa página, uma certa dificuldade colada. Apesar de acessível a todos, porventura, ninguém se tinha apercebido antes dele, a não ser eu e o antigo marcador. Nunca antes, alguém tinha marcado a mesma página ou no meu caso, não tinha sido a página a marcar o leitor.
E então pensei que ao demorar a virar a página, já algo em mim seria diferente, já a minha percepção seria diferente, tal como foi a do antigo leitor. Apenas ele (ou ela), leu essa página á sua maneira, numa maneira só dela, inatingível a todos os outros, possível de alguma compreensão, mas a sensibilidade que foi lida, nunca mais. Pois há sempre algo em nós que faz com que a visão não seja global, genuidade.
O mundo é feito de sucessões, não fosse a biblioteca, não fosse as minhas amigas, não fosse um autor, não fosse um livro, não fosse um vinco e talvez nunca teria pensado nisso. Não fosse eu, a sentar-me aquela hora, naquele local e talvez também não me tinha apercebido, e não fosse isso, talvez a sua leitura não me parecesse agora indispensável. Apenas a palavra é a mesma, mas sempre lida de maneira diferente, sentida de maneira diferente. Devo tudo á primeira pessoa que gemeu as primeiras onomatopeias.
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