Não é necessário que saias de casa. Fica
à mesa e escuta. Não escutes, espera apenas.
Não esperes, fica em silêncio e só. O mundo
virá oferecer-se a ti para que o desmascares,
não pode fazer outra coisa, extasiado, ´
contorcer-se-á diante de ti.

Franz Kafka, "Aforismos"


segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

O Reino - parte IV

Noite posta, uma comunhão de vozes e espíritos denunciados, tochas à frente dando certa a perdição, a escuridão como espelho do medo. Rostos como sombras, sombras como rostos, essas ruas hoje não eram delas, algo as invade. Fogo conhecido de todos e por nenhum enfrentado, uns ouviam escondidos no seu beco, no seu receio, outros nem ouvir tentavam, incapazes. Poucos, os que falaram apenas sentenciaram a Voz da manifestação (nunca seu espírito), impotente perante a chama de almas sem cor, sem brilho, sem o timbre ficava, só.
Entraram e levaram-no, nada podia fazer, evitava as lágrimas de Clara e seus filhos. Atingido por erros de julgamento. Juízes com mão nos jurados, jurados com mão na bolsa, advogados estendendo a mão. Nenhuma defesa possível, todos o sabiam.
Choros, alegrias, crianças, mulher, casa, vida, tudo condenado. Esperança para nenhum, longe estavam os urras e aplausos, apenas uma mulher chorava seus filhos confusos e Um olhar cabisbaixo, um olhar fixo na próxima morada.
Pai, gritavam sem nada ser respondido.
-Pai!
As escadas rangiam dor e anos, lentas, primeiros momentos, últimos momentos,primeiros passos, seus últimos passos, (talvez só agora lhes dava importância, só agora que nunca mais as veria), imploravam na sua cabeça para ficar, tentasse e uma arma como resposta teria, linguagem de onde era natural.
Foi, pensando em mil problemas, mil sentimentos em vez de coração, mil angústias em forma de alma, tudo á volta do mesmo, os seus que ficavam, que o choravam e olhavam sabendo ser a última vez, nada podia ser feito mesmo desprovidos de culpa.
Para trás uma casa materialmente igual, mas sem seu guia. Como se a Lua faltasse à Terra, tornando-a incapaz de controlar seus elementos, seus mares, preponderante como sempre fora. Suspensos agora aqueles planetas sem satélite, sem a beleza de em momentos escuros a verem, sem a segurança de mesmo em luz a terem. Um simples grão agora, um aglomerado de grãos tais eram os sentimentos, a Lua. Alguém de imagem distante mas sempre presente faltava agora, nobre na sua essência. Rodeados de planetas e estrelas, milhões…mas sós.
Um vento enorme entrava pelas portas, pelas janelas, por qualquer buraco anteriormente invisível mas bem real agora, sem a Lua, a sua Lua. Ela como vento, eles apenas o sentiam, agora já não é deles, passam outros que não os conhecem, sem resposta, sem olhar, sem chorar com eles, iguais a todos os outros, outros mais, não interessam, outro mundo, o vento como Lua passa, eles, planetas apenas outros mais, outros mais…
Outros mais num sítio que já não o é, pessoas que já não o são, alegria que já não vive, pois ela, Lua como vento, foi-se.
-Pai!
-(Lua!)

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